O presente blog se propõe a reflexão sobre os Direitos Humanos nas suas mais diversas manifestações e algumas amenidades.


domingo, 27 de maio de 2012

Marcha das Vadias: Você também é uma!


Queria ter estado presente na Marcha das Vadias. Só no nome já é ótimo.

Um amigo me perguntou o que era a Marcha das Vadias. Fui ao google confirmar aquilo que pela designação já era intuitivo. A defesa dos direitos da mulher.

O movimento recebeu esse nome em um protesto no Canadá em resposta à declaração de um policial que durante uma palestra na universidade de Toronto teria sugerido às estudantes que evitassem se vestir como “vadias”, para não serem vítimas de assédio. O comentário do policial revoltou as alunas, que realizaram uma manifestação contra a ideia de culpar as mulheres pela agressão que sofrem.

Felizmente este movimento tomou proporções além fronteiras e chegou ao Brasil. Constatei nas redes sociais que aqui no Rio de Janeiro mobilizou também as lésbicas, travestis e transexuais que se uniram em uma só voz pela mesma questão e se fizeram presentes ao ato de manifestação.

Mas, com certeza, essa luta contra a cultura machista e ditadorial é muito mais abrangente. Pertence a todos, independente do gênero e da orientação sexual. Todos aqueles (homens e mulheres) que respeitam a liberdade, ao direito à igualdade e a democracia deveriam estar lá, prestigiando tais ideais, pois estes eram os verdadeiros estandartes.

Quem melhor que lésbicas, travestis, transexuais e inclusive, gays e bissexuais para saber o que é ser tratado com desrespeito e menor valia, e ainda, ao final, de vítimas serem tratados como os errados ou culpados, porque não atenderam a normas machistas impostas por aqueles que se consideram donos das regras comportamentais adequadas?

As "vadias" são as mulheres vítimas da violência machista. Estes machinhos, que socialmente tanto criticam a cultura islâmica, mas se comportam de forma idêntica, insistindo em inverter valores e responsabilidades. Para estes, a culpa é sempre da mulher que se comportou ou se vestiu de forma inapropriada, "provocando" os homens. 

Valendo-se da mesma lógica, estes homens agridem publicamente travestis na rua, porque, afinal, elas estavam na rua se comportando e se vestindo de forma que justificasse a agressão. Se for com uma lésbica, a violência se legitima com o 'estupro corretivo' para mostrar para ela aquilo que ainda não encontrou, um homem de "verdade". No fim, portanto, para eles, a culpa sempre foi delas. O assustador é que há quem concorde.

As "vadias" são as mulheres que sentem desejo, escolhem sua caça e transam. Como se isto fosse um direito e privilégio exclusivo dos homens. Para alguns deles, os machos não só podem como devem agir desta forma para confirmar sua virilidade. Elas não, se fizerem o mesmo, são vadias.

"Vadia"  é a mulher que escolhe o que fazer com seu corpo. Para a mente machista, o corpo da mulher lhe pertence e é ele que deve dizer o que ela pode ou não fazer com ele.

Para o pensamento machista, mulher vale menos. E, dentro de um menu variado de opções de adjetivos depreciativos, como apelidam um gay? "mulherzinha"! Portanto, não à toa, um "diminutivo" pejorativo de mulher! Numa referência clara que gay é pior que mulher. O estupro é sem o genital, enfia-se uma estaca, um cabo de vassoura, uma garrafa e equivalentes na bunda de um gay. Mata-se.

Lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros acordem! A Marcha das Vadias também lutou por todos vocês!

As "vadias" pintaram o sete e mostraram a que vieram. Originais, guerreiras e revolucionárias.

Pintaram mensagens em seus próprios corpos e cartazes: "Não vim da sua costela, você que veio do meu útero"; "Minha bunda, minhas regras"; "Sim, nós gozamos"; "Nem santa, nem puta. Livre"; "Meu corpo, minha regra"; "A porra da buceta é minha"; "Sou vadia, mas isto não te dá o direito de estuprar", entre muitos outros.

As vadias para mandarem o seu recado e mobilizar nacionalmente a atenção NÃO precisaram de uma Parada, nem de carros alegóricos ou caminhões de sons com músicas diversas. Fizeram uma MARCHA cidadã,  repleta de protestos nos seus corpos e em simples cartazes, criativa e absolutamente revolucionária.

A diversão foi consequencia e não a causa da presença. Principalmente, por conta da seriedade do contexto e motivação,  fez muita gente pensar.

A Marcha das Vadias foi um sucesso! 

sexta-feira, 25 de maio de 2012

O Congresso Nacional, o novo Projeto de Lei 612/2011, os LGBTs e eu


Sem dúvida hoje obtivemos uma excelente notícia.

O projeto de lei do Senado, nº 612 de 2011, proposto pela Senadora Marta Suplicy, que deseja alterar os artigos 1723 e 1726 do Código Civil, para permitir o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo, assim como o direito da conversão desta união em casamento foi aprovado pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, conduzido pelo relatório e voto da Senadora Lídice Mata. Este projeto agora segue para outra comissão do Senado, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (em decisão terminativa.)

Significa dizer que, de efetivo, podemos contabilizar dois ganhos: (1) por si só, a iniciativa da proposta deste projeto de lei da sempre louvada Senadora Marta Suplicy; (2) e agora, ver ultrapassado o momento seguinte com a aprovação da Comissão de Direitos Humanos do Senado.

Mas sem querer ser estraga prazeres, e em respeito à realidade, considerei efusiva demais a conotação dada pelos meios de comunicação em torno desta notícia. O caminho deste processo legislativo está muito mais longe que perto de seu final.

É que se trata de um projeto de lei que foi proposto no Senado e que ainda tem que passar pela Câmara de Deputados e, no longo e dificílimo caminho a percorrer, até agora passou única e exclusivamente por uma única Comissão, ou seja, nem mesmo no próprio Senado Federal ainda foi encerrada a tramitação para que possa ser encaminhada para Câmara de Deputados.

Não estou desmerecendo esta importante vitória, mas receio que alguns menos atentos possam fantasiar que nosso Congresso Nacional mudou ‘para melhor’ em relação aos direitos de LGBTs ou que, pelo alarde criado, esteja a aprovação deste projeto com os dias contados naquelas casas (Câmara de Deputados e Senado Federal), que diga-se, JAMAIS APROVARAM, ATÉ HOJE, QUALQUER LEI EM FAVOR DE DIREITOS LGBT.

Já vivemos situações nas quais outros projetos de leis avançaram muito mais que a mera aprovação por uma mera comissão. E, nem por isso, chegaram até hoje ao seu termo final, para que pudéssemos, de fato e consubstancialmente, festejar.

Basta confrontar os andamentos do Projeto de Lei nº 5.003-B, de 2001, da então Dep. Iara Bernadi, hoje conhecido por Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 122, de 2006, que pretende criminalizar a prática da homofobia. Este projeto de mais de uma década atrás foi aprovada por todas as comissões e, pasme, em regime de urgência, por proposta do Deputado Rodrigo Maia, também aprovado pelo plenário da Câmara de Deputados, e há seis anos está no Senado, com incontáveis idas e vindas, até hoje sem aprovação. Total de onze anos já transcorreram.

Aliás, outro antigo projeto de lei nº 1151, de 1995, da própria Marta Suplicy, enquanto Deputada Federal, que pretendia o reconhecimento da “união civil”, mais adiante especificada como “parceria civil registrada” para pessoas do mesmo sexo, passou por todas as comissões naquela casa e jamais foi levada a votação no plenário, até porque, todos sabiam, já muito defasada. Dezesseis anos se passaram.

O lamentável histórico do Congresso Nacional em relação aos direitos LGBTs neste país não é nada inspirador e, por este motivo, apesar desta vitória nesta comissão no senado, me sinto no direito de considerá-lo devedor, e me sentir um credor, que não se regozija com expectativas de uma dívida até hoje efetivamente não paga.

O Poder Judiciário, através da sua Corte Máxima, por unanimidade, já cumpriu a sua obrigação constitucional de reconhecer estes mesmos direitos no julgamento da ADPF 132 e da ADI 4277, apesar de existirem ainda alguns juízes narcisistas que se julgam acima da constituição federal e do poder hierárquico a que estão submetidos. Da mesma forma o Poder Executivo, que dentro de seus limites, no governo anterior, conferiu alguns semelhantes direitos na área administrativa.

Com a ressalva de alguns congressistas, o Congresso Nacional sempre foi intencional e gravemente omisso com os cidadãos homossexuais brasileiros. O que parcialmente esboça fazer agora,  vergonhosamente, chega com atraso e não é mais que sua obrigação, sob a ótica humanista e constitucional. Enquanto estes políticos reacionários que temporariamente ocupam a Câmara de Deputados e Senado Federal não mudarem os direitos universais do homem e os princípios fundamentais da nossa Constituição Federal, meus direitos eu exijo, quer eles façam projetos de leis ou não, e não há aplausos, por apenas desenharem o possível cumprimento do dever constitucional. 

Da minha parte, como cidadão não contemplado com a efetiva igualdade e dignidade que me são garantidos, há exigências e reclamações. Calejado, eventuais aplausos, ainda assim tímidos, ficam para depois, se for o caso. 

terça-feira, 22 de maio de 2012

O Pesadelo Americano de Tyler Clementi


Li hoje a notícia no site do Globo.com que o tribunal de Nova Jersey sentenciou nesta segunda-feira (21) o jovem estudante Dharun Ravi, de origem indiana, com uma pena de 30 dias de prisão e três anos de liberdade assistida por ter gravado seu companheiro de quarto mantendo relações sexuais com outro homem, o que veio a resultar no suicídio do mesmo após sua divulgação na internet.

O acusado poderia pegar dez anos de prisão e até ser deportado de volta ao seu país por causa do suicídio de Tyler Clementi, no entanto, o juiz Glenn Berman limitou sua sentença a 30 dias de prisão e também não ordenou sua deportação.

Estamos falando do caso do rapaz nos EUA que tirou sua própria vida por não suportar sofrer bullying motivado por homofobia causado com consciência e vontade pelo o acusado em questão.

As armas utilizadas para este crime, cometido por Dharun Ravi, foi triplamente perversa, (1) a gravação por vídeo e (2) a divulgação na internet de um momento absolutamente íntimo de Tyler, no qual ficava revelada a sua orientação sexual e o (3) máximo estímulo da humilhação de um coletivo preconceituoso e discriminatório. Resultado: morte.

Ao meu ver se trata de um caso de homicídio, onde o marginal pouco se importou se o resultado de seus atos criminosos poderia ter um desfecho com morte física ou não.  O aniquilamento moral e psicológico da vítima era notoriamente sabido e foi, principalmente, desejado. 

A morte, no caso, foi apenas uma consequencia, que ainda que não explicitamente desejada, era possível de se cogitar. Ele, Dharun Ravi, aceitou isto e deveria ter respondido pela morte de Tyler Clementi.

Mas todo sofrimento passado por Tyler Clementi que culminou na perda do maior de todos os direitos existentes, a vida, foi resolvido numa penalização de 30 dias de prisão.

Pela legislação criminal do estado americano em questão o acusado poderia poderia pegar dez anos de prisão e também ser deportado de volta ao seu país de origem. Dez anos de prisão representam aproximadamente 3600 dias de cadeia, o acusado pegou 30 dias e, óbvio, sem deportação. 

A mensagem passada pela justiça americana foi que a perda de uma vida causada por bullying motivado por homofobia merece castigo mínimo e que não se tratou de algo grave.

Tyler Clementi veio a este mundo para ser mártir e sofrer de forma intensa do mal da discriminação. Não bastou sofrer uma odiosa tortura em vida, teve agora também sua memória vilipendiada em morte. 

Para os homossexuais dos EUA, com o resultado deste julgamento, o dito 'sonho americano' parece estar mais próximo da definição de um 'pesadelo'.  
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