O presente blog se propõe a reflexão sobre os Direitos Humanos nas suas mais diversas manifestações e algumas amenidades.


domingo, 25 de março de 2012

Salvem as crianças cariocas vítimas do bullying!


Até então, só concebia a defesa da baleia, mico-leão-dourado, da água no planeta e assim por diante. Não poderia imaginar que um dia escreveria um título como este: ‘salvem as crianças cariocas vítimas do bullying’.
Entendo como legítimo que um político queira, num ano eleitoral, defender sua plataforma e aprovar seu projeto de lei para pedir novos votos para próxima eleição municipal.
Consigo até admitir, mesmo absolutamente perplexo, que ainda exista alguém que orgulhosamente bata no peito dizendo que pode ser chamado de homofóbico.
Mas tudo tem limite.
Este limite foi ultrapassado esta semana na Câmara de Vereadores da cidade do Rio de Janeiro.
Assisti ao vivo pela televisão, ninguém me disse. Me senti violentado, na alma, no corpo e na inteligência. Fiquei esgotado e, naquele momento, confesso, vacilou um pouco a minha fé no ser humano.
O projeto de lei apresentado pelo Vereador Bolsonaro, além de ser escancaradamente inconstitucional, é uma cortina de fumaça que num sopro, se realmente quisessem, seria desvendada. Mas o preconceito do Vereador, infelizmente, encontrou boa acolhida na maioria de seus pares. E ele, o preconceito, como todos sabem, cega e emburrece, e muitas vezes, inclusive, mata!
Não tenho dúvida que a intenção de todos os Vereadores foi de proteger a criança na escola, mas nem isso retira de cada um deles a gravíssima responsabilidade da desgraça que projetaram para aquelas crianças que deveriam estar sendo defendidas.
A cortina de fumaça foi exposta de maneira a fazer crer que se pretendia proteger o estudante do ensino fundamental da imoralidade, proibindo qualquer material didático que contivesse tema em defesa da diversidade sexual ou de combate à homofobia, o que, segundo entendi, poderia influir na 'boa formação' de uma criança. O vereador foi muito aplaudido pela maioria de seus pares depois de sua fala.
Se este projeto de lei passar, TODAS as crianças serão suas vítimas.
Estudantes do ensino fundamental são crianças e adolescentes, e como notoriamente sabido, ainda que na maioria das vezes não façam por mal, podem agir com certa crueldade. É próprio da idade, inexperiência e ingenuidade. Para isto também estão lá, para o auxílio na educação e no convívio social.
Não se trata de nenhuma novidade e por esta razão existe a obrigatoriedade da intervenção do Poder Público reproduzida por normas e leis, como a lei contra o bullying.
Na cidade do Rio de Janeiro há uma lei contra bullying (Lei 5089/2009) e se o projeto de lei do Bolsonaro passar estaremos diante de uma situação esdrúxula que merecia atenção até dos Tribunais Internacionais: Todas as crianças deverão ser protegidas da prática de bullying, exceto as maiores vítimas, aquelas que sofrerem em razão da homofobia.
É uma criança negra e sofre bullying motivado por racismo, a escola tem que fazer um trabalho e oferecer material didático as demais crianças para interagir, ensinar e fazer cessar essa odiosa discriminação.
É uma criança deficiente ou gorda ou “cdf” e sofre bullying motivado por tal particularidade, por força de lei, a mesma escola também deverá atuar para cessar o tormento por ela sofrido.
Mas se for uma criança que sofra bullying motivado pela homofobia, esta continuará a sofrer no dia a dia. A escola e/ou professores, também por obrigatoriedade da lei (no caso, por esta do Bolsonaro), não poderão atuar com nenhuma espécie de didática para fazer cessar a tortura massacrante vivida por esta criança. Os alunos, mesmos os que maldosamente maltratam e torturam aquela vítima do bullying, devem ficar “a salvo” do material que a eduque e ensine a não discriminar e respeitar seu coleguinha, quando o motivo seja homofobia.
Mesmo odiando homossexuais ou o que estes representem em suas cabeças, esses parlamentares deveriam lembrar que outras também sofrerão. Independe da orientação sexual, basta um garoto ser mais sensível ou uma garota gostar de bola para serem taxados como homossexual pelos coleguinhas e eventualmente serem vítimas do bullying motivado pela homofobia.
A UNESCO, que imagino que todos saibam que não se trata de uma associação gay, no ano de 2011 relatou que a maior incidência que causa o bullying foi detectado como o motivado pela homofobia.
Pelo projeto de lei do Bolsonaro, aprovado e aplaudido pela Câmara de Vereadores, fica proibido terminantemente qualquer material na escola, seja que espécie for, que combata o preconceito e a discriminação aos homossexuais, bissexuais e trangêneros, portanto, se aprovado, o bullying motivado pela homofobia passará a ser a única causa que não será combatida didaticamente nas escolas da cidade do Rio de Janeiro.
Se aprovado este projeto de lei e existir algum livro fazendo alusão ao combate a homofobia ou fazendo constar o que determinado pelo CONAE em 2010, pela letra deste projeto de lei, a página teria que ser arrancada ou o livro inutilizado.
A falta de sensibilidade daqueles que votaram, nesta primeira discussão, a favor deste odioso projeto de lei me faz questionar se a ausência de empatia seria porque para eles seja mais fácil se colocarem no lugar daquelas crianças que praticavam o bullying e não daqueles que foram as vítimas de tal preconceito.
Para estes vereadores, que nomeio abaixo, um a um, desejo a conscientização da absoluta inconstitucionalidade de tal projeto, pois o município estaria infringindo os princípios basilares da Constituição Federal, Estadual e Lei Orgânica Municipal, assim como o seu dever de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à dignidade, ao respeito, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, violência, crueldade e opressão (artigo 247 CF), isto sem considerar a violação ao Programa Nacional De Direitos Humanos (PNDH-3); a Convenção sobre os Direitos da Criança, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA; a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969) (Pacto de San José da Costa Rica); os Princípios de Yogyakarta; e ainda mais especificamente, os “PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS” do Ministério de Educação e o documento final da CONFERENCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO - CONAE 2010.
Mas pior que violar princípios constitucionais, tratados internacionais, leis e diretrizes curriculares é reconhecer que tais vereadores foram preconceituosos e inconsequentes, com implicações tais que podem gerar consequências irreversíveis, como constatamos com fatos reais e públicos: a recentíssima notícia de tais torturas em ambientes escolares chegarem ao ponto de levarem crianças ao suicídio, como o estudante de 12 anos no Espírito Santo em fevereiro passado ou a tentativa do mesmo ato pelo adolescente do Rio Grande do Sul.
No dia que os senhores vereadores votaram a primeira discussão, Ana Maria Braga entrevistava o garoto do Rio Grande do Sul. A Rede TV este ano fez também uma matéria sobre o outro caso, o suicídio da criança de apenas 12 anos de idade que não aguentou o bullying motivado na homofobia:
Isto, infelizmente, não é nenhuma novidade e já foi tema do Profissão Repórter. Outra vítima, outra criança:
Políticos, com ‘P’ maiúsculo, propõem políticas públicas em sentido oposto deste projeto de lei, como podemos ver o presidente Obama nos EUA.
Crianças e adolescentes MORREM, senhores Vereadores, em decorrência da tortura praticada por outras crianças e adolescentes. São crianças que, num solitário desespero, não possuem opção, estão obrigadas pelos pais a comparecerem, dia após dia, a escola. Muitas vezes sem que a administração escolar ou poder público, em geral, também tenha plena ciência de tal sofrimento ou que faça efetivamente algo para impedir isto.
Se isto ocorrer com crianças ou adolescentes nas escolas municipais do Rio de Janeiro, tenha consciência, haverá sua contribuição com o voto favorável a este projeto, valendo-se da falsa premissa da boa intenção, apenas para não reconhecer sua verdadeira face preconceituosa.
São crianças, apenas crianças. Não as usem apenas para demonstrar sua posição ser contrária a existência dos homossexuais, #diganaoaleidobullying !


Votaram pela aprovação do Projeto de Lei em questão os Senhores Vereadores Argemiro Pimentel, Carlo Caiado, Carlos Bolsonaro, Dr. Edison da Creatinina, Dr. Eduardo Moura, Dr. João Ricardo, Dr. Jorge Manaia, Ivanir de Mello, João Cabral, João Mendes de Jesus, Jorge Braz, José Everaldo, Luiz Carlos Ramos, Márcia Teixeira, Nereide Pedregal, Patrícia Amorim, Professor Uóston, S. Ferraz, Tânia Bastos, Tio Carlos e Vera Lins.
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